Cavalcante (GO) e Arraias (TO) foram capitais após a primeira tentativa de separar a província de Goiás
Cavalcante (GO), no nordeste do estado, e Arraias (TO), hoje no sudeste do Tocantins, foram importantes cidades em meados de 1820, ainda no Brasil Colônia, pouquíssimo tempo antes da independência do Brasil.
A informação está em um livro raro da escritora e historiadora Regina Lacerda, “A Independência em Goiás”, publicado em 1970 pela Gráfica do Livro Goiano.
A obra está disponível na Fundação Cultural Frei Simão Dorvi, na Cidade de Goiás, antiga capital do estado, que levava o nome de “Vila Boa”.
Tive acesso ao livro e passo agora a dar publicidade a esta importante passagem histórica do nosso estado e da nossa região.
A historiadora conta que administrativamente a província de Goiás tinha duas comarcas: uma no Sul, em Vila Boa, a capital, e outra no Norte, a Comarca de São João das Duas Barras, criada com alvará de 18 de março de 1809.
No Sul, comandava a comarca e toda a província o então capitão-general Manoel Inácio Sampaio, português, homem de confiança de Lisboa.
No Norte, mandava o ouvidor, o desembargador Joaquim Teotônio Segurado, que residia em Cavalcante e Arraias.
Segundo a autora, ele tinha um caráter violento e mantinha os moradores do Norte sob controle rígido. Ele, no entanto, não gostava do capitão-general Sampaio, mas era adesista à Corte de Lisboa.
Outro nome forte de São João das Duas Barras era o do brigadeiro Felipe Antônio Cardoso, morador e dono do engenho Sumidouro, hoje situado em Monte Alegre, próximo ao Rio Montes Claros, ao lado de Campos Belos (GO).
O brigadeiro Felipe é avô do bisavô deste jornalista.
Um terceiro nome forte era o do vigário Francisco Joaquim Coelho Mattos.
Quando pipocou a revolta em Portugal, foi exigido o retorno de Pedro I a Lisboa, e houve uma pressão para o Brasil voltar a ser colônia. Essa Revolução Liberal do Porto, em 1820, foi decisiva.
Assim, ameaçado de perder o trono português, Dom João VI retornou a Lisboa em abril de 1821. Segurado e Felipe Cardoso logo se insurgiram contra o presidente de Goiás.
Eles queriam a independência dessa parte da província e, aproveitando a confusão no Rio de Janeiro, partiram para o confronto com o presidente da província de Goiás, capitão-general Manoel Inácio Sampaio.
O povo do Norte se sentia desprezado pela capital e, com esse ambiente político tenso, logo os líderes declararam São João das Duas Barras independente de Goiás e instituíram um governo provisório. Instalado o governo em Cavalcante, criou-se uma junta de sete membros, sendo Joaquim Segurado o presidente nomeado.
Dias depois, a capital São João das Duas Barras foi transferida para Arraias. Um comunicado foi feito ao Imperador, no Rio de Janeiro, e por meses aguardou-se a decisão da Corte em aceitar essa nova província separada de Goiás.
Temendo um golpe de Segurado, que, como dito, era um homem violento e mal visto, a capital foi novamente transferida, agora para Natividade.
Essa transferência ocorreu durante a viagem de Segurado a Lisboa. A bordo de um navio, ele passava pelo Pará, província onde havia muitas tropas portuguesas leais a Lisboa.
Com a ausência de Segurado, o capitão Felipe assumiu a presidência da nova província. Foi ele quem recebeu a notícia da Independência do Brasil, três meses depois do acontecido, na fazenda Sumidouro, por meio de um jornal que veio da Bahia e foi entregue a cavalo.
Mas Vila Boa não deixou barato a insurreição e não aceitou a independência. Mandou para o Norte o padre Luiz Gonzaga Camargo Fleury, que foi “pacificar” a situação.
Mas quando chegou a Cavalcante, logo prendeu o brigadeiro Felipe e o mandou à capital da província e depois ao Rio de Janeiro, para se apresentar à Corte.
Morria aí o governo insurgente da província do Norte. Pior, meses depois, José Bonifácio de Andrada e Silva, o regente do imperador-menino Dom Pedro II, proclamada a Independência, comandou uma política centralizadora e organizou a ação militar contra os focos de resistência à separação de Portugal.
E claro, negou a independência de São João das Duas Barras. Portaria de Bonifácio, trazida pelo emissário José Bernardino, comunicou a não aprovação por parte de D. Pedro II da separação de Goiás.
O capitão Felipe foi mandado a ficar preso em casa, recolhido na Fazenda Sumidouro.
A fazenda até hoje existe, próximo a Campos Belos, onde é possível observar vestígios das ruínas da casa principal. No local também havia 30 outras moradias pertencentes ao engenho da família.
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