Evento em Alto Paraíso de Goiás discute futuro das Reservas da Biosfera no Brasil

Pela primeira vez desde que lançou o Programa Homem e Biosfera (MaB – Man and the Biosphere), em 1971, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) escolheu Goiás para sediar um encontro em que foram discutidos aspectos de gestão e governança das Reservas da Biosfera do Brasil.

O evento aconteceu em Alto Paraíso de Goiás, entre os dias 23 e 25 de abril, e foi organizado pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD).

Além da secretária Andréa Vulcanis, que representou o Governo de Goiás, participou o diretor da Divisão de Ciência Ecológicas e da Terra da Unesco, Antônio Domingos de Abreu, sediado em Paris e também a Secretária Nacional de Biodoversidade, Florestas e Direitos dos Animais, do Ministério do Meio Ambiente, Rita Mesquita.

Também participaram representantes das sete reservas da biosfera existentes do País, que são: Mata Atlântica, Cinturão Verde de São Paulo, Cerrado, Pantanal, Caatinga, Amazônia Central e Serra do Espinhaço, totalizando em torno de 30 pessoas que discutiram com profundidade os destinos das Reservas da Biosfera brasileiras.

“Foi um evento muito bem-sucedido, em que tivemos a oportunidade, além de mostrar os planos e projetos do Governo de Goiás no território da Reserva da Biosfera, em Goiás, também mostrar as iniciativas exitosas de gestão da SEMAD e, como não poderia deixar de ser, o Cerrado goiano para representantes de outras reservas da biosfera”, afirma Vulcanis.

“Goiás levou suas políticas públicas para o Brasil e para o mundo, e o diretor da Unesco se despediu decidido a mostrar, para outros países, os avanços que já alcançamos em nossa reserva, levando nossas ações e resultados que ele considerou muito efetivos”.

Ao fim do encontro, os participantes redigiram um documento chamado “Carta de São Jorge”, que é uma espécie de protocolo de intenções com diretrizes para governança das Reservas da Biosfera. Essas reservas são ‘laboratórios’ em que todos assumem o compromisso com a preservação do meio ambiente e, ao mesmo tempo, com o avanço da economia, sem que haja qualquer espécie de constrangimento ao desenvolvimento.

A reserva da biosfera do Cerrado tem 29,6 milhões de hectares, e alcança 191 municípios em cinco estados do País: Goiás, Distrito Federal, Tocantins, Maranhão e Piauí.

Governança
A Unesco se fez representar por um de seus diretores, Antônio Abreu, que trabalha em Paris e gerencia dois grandes programas mundiais no âmbito do meio ambiente:

O Programa de geoparques e o Programa MaB. As reservas já estão presentes em 148 países e a meta é fazer com que todos os países do mundo tenham pelo menos uma reserva até 2030.

O diretor explica que a Unesco, em comum acordo com os Estados, decidiu que o programa deve ser flexível, mas com uma estrutura mínima.

Essa estrutura comporta três níveis: um órgão estatal; um participativo, ou consultivo, que seja uma espécie de assembleia geral informal (comprometida a se reunir pelo menos uma vez por ano, para dialogar e sugerir); e um conselho científico, destacado para tratar questões alusivas a biologia, economia, sociologia e outras matérias de escopo acadêmico.

Abreu afirma que, caso a caso, existe a possibilidade de se convidar diferentes parceiros para contribuir com a governança das reservas, desde que, preferencialmente, já estejam presentes no território. Na maioria dos cenários, a liderança administrativa é exercida por um ente público. Mas nada impede que ela seja outorgada ao setor privado.

“Conheço reservas que são geridas pelo setor privado. Na Austrália, por exemplo, o governo lança concursos a cada dez anos para privados concorrerem. Em Portugal, há uma reserva que quem gerencia é uma sociedade de agricultores. É caso a caso”, diz o representante da Unesco.

Abreu cita, como exemplo de Reserva de Biosfera bem-sucedida, a reserva situada em um local chamado Ilha do Príncipe, no arquipélago de São Tomé e Príncipe.

“É um dos países mais pobres do mundo. O ordenado médio, até 2012, era em volta de 20 euros por mês. Um professor de licenciatura ganharia 100 euros. Hoje, o agricultor já ganha mais do que o professor ganhava há 10 anos. Não houve milagre.

As pessoas colocaram mãos à obra e uniram-se em torno de uma visão. Entenderam que o ativo de todos eles são a natureza e as pessoas. O aeroporto deles, por exemplo, foi construído por um investidor privado, na lógica do empreendedorismo sustentável criada pela reserva da biosfera. Criamos empregos e reduzimos a emigração de jovens”, relata.

Encanto por Goiás

Ao fim do encontro, o diretor da Unesco reconheceu o empenho de Goiás em promover, de forma simultânea, a conservação do meio ambiente e o desenvolvimento da economia.

“Senti-me em casa. A natureza é diferente, mas as pessoas são iguais. É um lugar maravilhoso. É esmagador, essa é a palavra. Existe imponência em cada momento, em cada olhar. Eu sou biológo, sei ler a natureza, enfim: é esmagador. Vi também grande potencial em termos paisagísticos, em termos de turismo. Se bem gerido, se bem posicionado, com alta qualidade, é possível formatar aqui uma experiência muito eficiente”, disse o diretor.

“Testemunhei o empenho dos diferentes atores e do governo de Goiás, o que é raro. Muitas vezes o que acontece é que a sociedade civil é que tem que tentar convencer o governo. É muito raro termos o governo tentando convencer a sociedade civil”, complementou Abreu.

“Vocês, do Governo de Goiás, não têm dimensão do que acabaram de fazer aqui, juntando gente de todo o país em torno de um só propósito”.

A secretária nacional de Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, Rita Mesquita, também compareceu e fez elogios à secretária Andréa Vulcanis. “É admirável o esforço do Governo de Goiás em levar adiante a agenda das Reservas da Biosfera, que propõe a conservação aliada ao desenvolvimento econômico sustentável. Foi uma honra participar desse momento”.

Carta de São Jorge

A carta de São Jorge, publicada ao término do encontro de Alto Paraíso e subscrita por todos os presentes, define-se como um “chamado coletivo e permanente para o apoio à implementação e o fortalecimento do Programa ‘O Homem e a Biosfera’”, da Unesco.

O que move o programa, de acordo com o documento, é o “desafio contínuo para promover, por meio de uma governança inclusiva, do diálogo, da cooperação intersetorial e multinível, a geração e difusão de conhecimento científico e tradicional, a conservação e o desenvolvimento sustentável”.

Os cinco compromissos estabelecidos pela carta são:

1) Promover um sistema de gestão democrática, transparente, participativo e inclusivo considerando a diversidade como um ativo para soluções sustentáveis;

2) Realizar programas formativos tendo a educação como um processo contínuo e permanente em todos os territórios;

3) Desenvolver programas e projetos de cooperação a fim de estabelecer a integração e trocas de experiência entre territórios, instituições, grupos organizados e populações;

4) Buscar oportunidades e estabelecer mecanismos de financiamento para apoiar práticas socioambientais nas Reservas da Biosfera brasileiras; e

5) – Implantar ferramentas de comunicação adequadas aos diversos públicos, levando informações, atualizações e aprendizagem coletiva.