Comunidade Quilombola da Extrema, em Iaciara (GO), cria ateliê para fabricação de bonecas de pano negra
A comunidade quilombola da Extrema, localizada no município de Iaciara (GO), região nordeste do Estado de Goiás, criou um ateliê para produção de bonecas de pano, que rementem a história e faz o resgate cultural dos povos quilombolas.
Ateliê Terezinha Rocha- Boneca Catarina
Catarina Maria da Conceição (1935-2020), que dá nome à boneca, foi benzedeira, parteira, cozinheira, merendeira e professora no decorrer das décadas.
Dona Catarina foi protagonista de diversas ações na comunidade, dentre elas, com a amiga Chica, incluíram a sussa no Mastro, nas festividades religiosas.
Ela morreu aos 85 anos, mas seu legado permanece na comunidade, sendo considerada a eterna matriarca, o nome da Boneca é uma homenagem a ela.
Terezinha Rocha, a qual o ateliê recebe o nome, era filha de Dona Catarina.
Foi uma pedagoga, liderança com diversos trabalhos prestados à comunidade, e morreu em 2017.
Embora tenha obtido o título de pedagoga e tivesse o sonho de auxiliar ainda mais o seu povo com a educação e alfabetização das crianças, partiu sem ver seu sonho realizado.
Produção de bonecas de pano
Em 2015, Terezinha criou o primeiro exemplar da boneca, ainda sem o nome de Catarina, e a levou para a escola da comunidade, onde foi merendeira, para apresentar às crianças do Projeto Quilombola.
Além disso, fez uma boneca para sua netinha que frequentava a escola.
Para sua surpresa, não houve boa recepção por parte da neta, então com cinco aninhos, o que a deixou reflexiva.
Após a reação negativa da neta, Terezinha conversou com Madalena, presidente da Associação Quilombola Extrema (AQUE), também sua madrinha, e começaram a pensar na identidade de uma criança quilombola.
Levaram a proposta para o grupo da associação e ali nasceu o desejo de fazer algo para mudar essa realidade.
A produção de boneca de pano, com tecido colorido, foi esquecida há mais de três décadas.
Em 2010, nasceu o projeto de produção de boneca negra, mas apenas no ano de 2021 foi possível viabilizar o projeto indentitário Boneca Catarina, por meio de um edital de fomento à cultura, realizado por meio da Lei nº 14.017 de 29 de junho de 2020, Edital CONCURSO N.º 02/2021 SECULT GO – PONTOS DE CULTURA – LEI ALDIR BLANC 2021 – Ponto de Cultura-Aldir Blanc.
A partir de então foi criado o ateliê para organização e profissionalização da confecção das bonecas.
Para além da geração de renda
A boneca Catarina, conforme afirma Madalena, vai muito além da geração de renda para um grupo composto por 98% de mulheres negras.
A boneca é carregada de significados e cada detalhe remete à história do seu povo.
Madalena afirma que após a hegemonização de bonecas com um único padrão, pele clara, cabelos louros e olhos azuis, as crianças negras não tiveram um autorreferencial para construção da identidade.
A roupa da boneca Catarina representa a sussa, dança de roda tradicional das comunidades quilombolas.
Existe ainda a versão “bebê” que representa o parto, antigamente todos feitos por parteiras, atividade que Dona Catarina executou inúmeras vezes.
Além disso, a boneca tem o propósito de reiniciar um processo histórico de construção de identidade, remetendo a ancestralidade de forma que possa empoderar a comunidade para enfrentamento do racismo estrutural e a inclusão igualitária das mulheres negras na sociedade.
Madalena ressalta o quão é importante a descentralização dos recursos na área da cultura, “não tínhamos alcance”.
Porém, diz que ao ler alguns editais elaborados pelo estado, exemplo Aldir Blanc, um ponto ficou evidente:
“É necessária uma reflexão sobre as políticas públicas do Estado”.
E pontua a necessidade de participação de lideranças na construção dos editais, já que o acesso ao recurso por meio do edital de fomento à cultura apresenta o impedimento para servidora quilombola, isto é, os escolhidos pela comunidade quilombola.
Próximos passos
Os próximos passos do ateliê Terezinha Rocha é fazer com que as bonecas cheguem à todas as escolas da região, já que o produto é uma representação cultural afro-brasileira, o que vai de encontro com Lei 10.639/03
“isso obriga a inclusão no currículo oficial da Rede de Ensino da temática “História e Cultura Afro-Brasileira. A primeira venda já foi feita para a Secretaria de Educação do município de Iaciara, que fará contato com todas as demais nos próximos meses”.
Onde obter
– As vendas do produto são feitas pelo próprio ateliê por meio do aplicativo de mensagens WhatsApp disponível neste link https://msha.ke/bonecascatarina/.
– Mais informações podem ser obtidas no Instagram do projeto https://www.instagram.com/bonecas_catarina/
– Veja o catálogo de produtos aqui