Ansiedade, depressão, com potencial suicida, são as maiores consequências do assédio moral e sexual
Por Dinomar Miranda,
O simpósio sobre políticas de prevenção e enfrentamento aos assédios moral, sexual e discriminação, promovido pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados da Justiça Militar da União (Enajum), fechou sua jornada de estudos e discussões nesta quarta-feira (23).
Quem abriu o segundo dia do evento foi a ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Maria Cristina Peduzzi, com o tema “A ética no ambiente de trabalho no contexto da Resolução 351/2020″, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
A magistrada falou sobre as origens do conceito de assédio moral e como esses atos ilícitos foram sendo tratados na legislação trabalhista e no Código Civil ao longo dos anos, produzindo jurisprudência capaz de oferecer possibilidade de enquadramento da conduta ilícita. Segundo ela, as diversas legislações têm sido bastante utilizadas, sendo a Justiça Trabalhista bastante acionada para fazer reparações em casos de assédio moral.
A magistrada ressaltou que a Lei 13.185, de 2015, que combate o bullying, conceituado como a intimidação sistemática, também serve de parâmetro para o assédio no ambiente de trabalho. Destacou, ainda, que a Resolução do CNJ prevê, além da punição, a prevenção dos vários tipos de assédios, com sensibilização sobre relações saudáveis no trabalho, os riscos e potenciais danos na prática de assédio moral nos locais.
Sobre assédio sexual, frisou que o crime já está no código penal brasileiro desde 2011, com pena de detenção de 1 a 2 anos de prisão. “A Justiça Trabalhista verifica se o assédio sexual foi praticado e os efeitos com as reparações trabalhista e civil pelos danos causados.
Consequências do Assédio
O segundo palestrante do dia foi o juiz do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios Ben-Hur Vizi, que levantou o tema “O Assédio Moral e o Assédio Sexual no Ambiente de Trabalho e suas Consequências.”
O magistrado citou os tipos de assédio e como são tipificados na legislação brasileira. Também lembrou que as suas consequências vão muito além do sofrimento individual das vítimas. “Há consequências para a economia, com a redução de produtividade e absenteísmo; para a sociedade, com o custo de tratamentos e indenizações; além de impactar no aspecto humano”.
Explicou que, no contexto pessoal, a vítima de assédio moral ou sexual desenvolve vários tipos de enfermidades emocionais e físicas como dores generalizadas, depressão, hipertensão, crises de pânico, podendo chegar ao suicídio. “No ambiente do trabalho, muitas vezes, os cargos são usados como ferramentas para o assédio sexual”, afirma. Ben-Hur Vizi elencou a cultura do machismo e do patriacardo como um dos motivos que levam os homens, em sua maioria, a cometerem assédios.
Na parte da tarde, a desembargadora do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e Conselheira do CNJ Salise Monteiro Sanchotene, falou sobre os fundamentos da Resolução nº 351, do CNJ, e teceu comentários de como ela foi construída e formulada no âmbito do Poder Judiciário. Disse que a primeira etapa de controle de cumprimento da resolução foi resultado de uma série de atos internos do CNJ e da construção de uma política de enfrentamento. Trouxe, ainda, dados de uma pesquisa feita junto a todos os tribunais do País.
Em 2021, segundo a pesquisa, 40% de integrantes respondentes dos órgãos do Poder Judiciário desconheciam ações de prevenção realizadas por seu tribunal; 18,7% afirmaram que seu tribunal não adotava qualquer medida preventiva; 56,71% dos respondentes disseram que sofreram assédio e discriminação e destes, 34,75% eram magistrados.
Ainda de acordo com a conselheira Salise Monteiro, a segunda etapa do cumprimento da resolução mobilizou as comissões dos tribunais, sendo que agora o CNJ vai tirar pontos dos tribunais no prêmio CNJ de Qualidade, se determinados pontos da resolução não forem atendidos. Explicou que está formalizando um acordo com as escolas dos tribunais para que o assunto e os fundamentos da Resolução façam parte da grade curricular, com programas unificados e pré-credenciados na Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam).
Outra ação trazida pela conselheira e que está sendo implantada junto aos comitês e grupo de trabalho é sobre os protocolos para o julgamento com a perspectiva de gênero, incorporada também para dentro das relações internas dos órgãos do Poder Judiciário brasileiro. “Hoje é uma recomendação. Mas já temos uma proposta que pode virar uma resolução. Como ouvir a vítima? Como levar a vítima à policia? Vamos implantar porque é necessário evitar um processo de revitimização da vítima de assédio”.
Por fim, Salise Monteiro informou que o Tribunal de Contas da União (TCU) criou um modelo de boas práticas e modelo para implantação do sistema de prevenção e combate ao assédio. É um manual de boas práticas para gestores e gestoras dos órgãos públicos do país. “O CNJ vai cobrar a política de prevenção e combate ao assédio dentro de pouco tempo dos tribunais do país”, alertou.
Crimes de Assédio Sexual
Um painel com a juíza do Tribunal de Justiça de São Paulo, Maria Domitila Prado Mansur, e com a juíza federal da JMU, Mariana Aquino, tratou das consequências dos crimes de assédio sexual.
“As mulheres em nosso país são vítimas de tudo quanto é tipo de crime. Inclusive da violência política e da violência institucional. Mas as mulheres não sabem como denunciar. Elas têm medo do que podem encontrar pela frente, por não saberem das consequências das suas denúncias. Falta confiança nas instituições. As mulheres não sabem como seriam recebidas no seu ambiente de trabalho. Não sabem qualquer conduta. Essa é uma preocupação que o CNJ e as comissões têm levado muito a sério”, disse a magistrada.
Mariana Aquino, por sua vez, trouxe as dificuldades das mulheres militares dentro dos quartéis, em especial em denunciar os casos de assédio, principalmente em virtude de uma carreira hierarquizada e da cultura machista que impera dentro das organizações militares. “O crime de assédio é muito grave dentro da seara militar. Afeta muito a hierarquia e a disciplina, porque dentro da caserna há que se ter confiança. Como confiar em um assediador?”, disse ela.
A juíza citou um caso julgado no STM, em que uma sargento foi assediada por um oficial por usar um perfume marcante. “O militar disse que aquele tipo de perfume atiçava os seus maiores desejos animalescos. Com a repercussão da fala no quartel, a própria sargento foi denunciada pelo Ministério Público Militar por denunciação caluniosa. Foi inocentada, claro, na primeira instância e aqui no Superior Tribunal Militar”, explicou a magistrada.
O simpósio foi finalizado com uma mesa redonda com duas psicólogas e uma juíza federal doutorada em gestão de pessoas e na formação e aperfeiçoamento de magistrados.
O foco foi adoecimento no ambiente de trabalho em virtude de assédio moral ou sexual. De acordo com as especialistas, ansiedade e depressão, inclusive com suicídio das vítimas, são as consequências mais comuns, na sociedade e nas relações internas dentro dos órgãos do Poder Judiciário, como consequências dos crimes. Participaram da Mesa Redonda o juiz federal da JMU Jorge Luís, a psicóloga Aline Alan Guedes, do STM, a juíza federal do TRF4 Ana Cristina Monteiro e a professora doutora Lis Andrea Soboll
O evento ocorreu, de forma presencial, nesta semana, e visou proporcionar aos participantes uma reflexão e discussão sobre as políticas de prevenção e enfrentamento aos assédios e à discriminação, principalmente no ambiente de trabalho, abordando estratégias para combater essas problemáticas e teve a coordenação científica da ministra do Superior Tribunal Militar (STM) Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha e da juíza federal da Justiça Militar da União Mariana Queiroz Aquino.
Fonte: Superior Tribunal Militar