Revista Veja: Deputados bancam advogados com dinheiro da Câmara. Vice-Governador de Goiás recebeu pelo serviço

Deputado Carlos Alberto Lereia
(PSBD-GO) foi quem pagou
Vice-governador José Eliton recebeu, segundo a Veja,
mesmo exercendo cargo público
 





Quem Pagou: Deputado Carlos Lereia 
Quem Recebeu? Escritório Freitas e Figuerêdo Advogados


Quanto pagou: R$ 117.600


Problema: O vice-governador de Goiás, José Eliton Figuerêdo Júnior, e o secretário de Infraestrutura do Estado, Danilo de Freitas, são sócios do escritório. 


No ano passado, os dois deixaram o DEM para ingressar no PP, atendendo os interesses do PSDB de Lereia.


Justificativa: O gabinete do deputado diz que a consultoria não tem relação com a parceria política. O advogado Leonardo Batista, que integra o escritório, diz que a ligação foi “coincidência”.




Gabriel Castro, de Brasília (Revista Veja) 


Na teoria, a verba indenizatória – rebatizada “Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar” – serve para que deputados e senadores não precisem pagar do próprio bolso para exercer o mandato. Não é absurdo que um parlamentar, especialmente de Estados com grandes dimensões territoriais, receba um auxílio financeiro para visitar o eleitorado que lhe entregou o mandato. 


Mas, como quase todos os benefícios criados para a classe política, a cota parlamentar tem vasto histórico de uso distorcido.


Na lista das rubricas mais difíceis de fiscalizar, e por isso mais suscetível a fraudes, está a contratação de consultorias. Um dos usos possíveis dessa verba é a contratação de advogados sob a justificativa de que eles prestam “assessoria jurídica”. 


Como os advogados não precisam bater ponto no gabinete nem são obrigados a produzir qualquer tipo de material escrito – a consultoria pode ser prestada, por exemplo, via telefone –, a fiscalização desses gastos é praticamente impossível. Para obter o ressarcimento, basta ao deputado apresentar, no fim do mês, uma nota assinada pelo advogado.


Alguns casos constatados pelo site de VEJA têm sinais de irregularidades – ou, no mínimo, de pouco zelo pelos recursos públicos – na Câmara dos Deputados. Um exemplo é o do deputado Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO). Em 2013, ele repassou 117 600 reais ao escritório Freitas e Figuerêdo, de Goiânia. Foram oito pagamentos de 14.700 reais.


Os sócios do escritório são Danilo de Freitas, atual secretário de Infraestrutura de Goiás, e José Eliton Figuerêdo Júnior, vice-governador do Estado. 


Danilo e José Eliton não podem advogar porque ocupam cargo público. Os pagamentos do gabinete ao escritório tiveram início na mesma época em que a dupla, filiada ao DEM, migrou para o PP – o que representou uma escolha pelo grupo político do governador Marconi Perillo (PSDB), o mesmo de Lereia.


Leonardo Batista, outro advogado do escritório, disse inicialmente ao site de VEJA não saber do contrato com o gabinete de Lereia. 


Depois, voltou atrás: afirmou que presta auxílio na elaboração de propostas e de relatórios a projetos de lei. Sobre a relação política entre Lereia, o vice-governador e o secretário, Batista tem uma explicação: “Foi coincidência”.


Mais comum do que a contratação de aliados é a destinação de recursos para advogados que defendem os parlamentares na Justiça. O deputado Renato Molling (PP-RS), por exemplo, tem um contrato com o escritório do advogado César Baumgartz. O acordo prevê a prestação de serviços ao gabinete do parlamentar. Mas Baumgartz também representa Molling em um processo que tramita em Sapiranga (RS).


O deputado Romário (PSB-RJ) também está na lista. O ex-jogador é réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por crime contra a ordem tributária. 


O advogado dele, Luiz Sérgio de Vasconcelos Júnior, recebeu 12.000 reais do gabinete do deputado desde junho do ano passado. O gabinete disse que a consultoria diz respeito à atividade parlamentar, e que Romário paga do próprio bolso pela atuação do advogado no Supremo.


Os parlamentares Sérgio Moraes (PTB-RS) e Chico das Verduras (PRP-RR) também mantêm contratos com advogados que os defendem na Justiça. Moraes é o deputado que já admitiu “se lixar” para o que diz a opinião pública. A dupla não respondeu ao site de VEJA.


Jusitifativa – A chamada “Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar” é a antiga verba indenizatória. O valor não é o mesmo para todos os parlamentares porque os deputados de Estados mais distantes de Brasília têm direito a gastar mais dinheiro com passagens aéreas. Para um parlamentar de São Paulo, por exemplo, a cota é de 33.730 reais. O valor serve para custear despesas com combustível, serviço postal, telefone e aluguel de escritório em suas bases.


A rubrica “consultorias” não é utilizada apenas para bancar gastos com advogados: a Câmara também aceita que os parlamentares paguem por serviços de empresas de pesquisas de opinião e assessoria de imprensa – apesar de existir outra rubrica específica para esta área. 


O uso da verba para bancar assessorias jurídicas é desnecessária: um parlamentar que queira manter um advogado em sua equipe pode nomeá-lo para um dos 25 cargos de livre nomeação de que dispõe cada deputado.


Cláudio Abramo, diretor da ONG Transparência Brasil, diz que a contratação de advogados com recursos públicos é totalmente injustificável: “Já existe muita gente exercendo tarefas que são relacionadas ao exercício do mandato. 


Até as pedras sabem que esse tipo de despesa pode ser alocada quase integralmente para fins pessoais”, diz ele. 


Mas, como o debate em torno da redução da cota parlamentar simplesmente inexiste no Congresso, o contribuinte vai continuar bancando despesas desnecessárias dos parlamentares.

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