Deserto de Notícias: Sem imprensa local, moradores de Cidade Ocidental buscam se informar pelo WhatsApp e Facebook
Por Elvira Lobato, do Observatório da Imprensa
Cidade Ocidental é um município goiano do entorno de Brasília. Sua prefeitura está a menos de 50 quilômetros da Esplanada dos Ministérios.
Não há jornais impressos com periodicidade regular, emissoras de rádio ou televisão em Cidade Ocidental.
Nem as rádios comunitárias — distribuídas gratuitamente pelo governo federal, que poderiam preencher esta lacuna — sobrevivem em Cidade Ocidental.
Proprietária de uma banca de jornais no centro de Cidade Ocidental, Maria Joana Gomes, de 59 anos, lamenta não ter um jornal diário local para oferecer à clientela.
Maria Joana diz que os meios de informação mais usados pela população são o WhatApp, o Facebook e o boca-a-boca.
“O vazio de informação qualificada é gritante. Não sei se há desinteresse de investidores em comunicação ou da população, porque a maioria passa os dias em Brasília e só está aqui à noite e finais de semana,” resume a promotora Marizza Fabiani Maggioli. “As notícias veiculadas nas redes sociais se resumem a fofocas, ou são apurações equivocadas ou imaturas, sem investigação e com pré-julgamentos.”
O Grito
Há um jornal impresso gratuito na cidade chamado “O Grito” com tiragem de 3 mil a 5 mil exemplares. Segundo seu proprietário, Divino Alves, o jornal circulou mensalmente no último ano, mas houve períodos em que foi quinzenal e outros em que foi bimestral.
Em entrevista ao Observatório da Imprensa, Alves se declarou aliado do prefeito Fábio Correa, eleito pelo PRTB e que migrou posteriormente para o PSDB.
“A dificuldade de se fazer um jornal sem recursos próprios é ficar preso à prefeitura,” diz. Se você é da situação, não pode mostrar o lado ruim do governo, porque te cortam logo. Querendo ou não você fica preso.”
A teia do WhatsApp
A página Radar Ocidental, no Facebook, é apontada pelos moradores como a principal fonte de notícias da cidade. Criada em 2017 pelo amazonense Wendel Gomes, tem 48.903 seguidores (70% da população), além de cinco grupos no WhatsApp que somam 1.280 participantes.
Wendel, assim como Divino, não faz cobertura imparcial dos fatos. Nossa reportagem o acompanhou em uma apuração sobre buraco nas ruas.
“O Radar se diz neutro, mas só ouve quem é de oposição e não publica a versão da prefeitura sobre os fatos,” retrucou o secretário de Comunicação do município, Marcos Wilson dos Santos.
Wendel tem seguidores em todas as faixas da população e entre os comerciantes que usam a página para divulgar suas promoções.
Na ausência da imprensa local, a população usa as redes sociais para compartilhar notícias, reclamar das falhas nos serviços públicos, cobrar providências da prefeitura, organizar protestos e festas comunitárias. Os grupos proliferam também na área rural do município.
O pernambucano Norberto Oliveira Gonzaga, de 57, técnico em reparo de fogões, e o maranhense Nivaldo Júnior, de 42 anos, segurança em uma empresa privada, passam o dia com o olho grudado no celular. Ambos moram no centro de Cidade Ocidental e são ativos nas redes sociais.
Norberto integra um grupo de 180 pessoas no WhatsApp. Sua família deixou o Nordeste quando ainda era menino e se instalou no Gama, na periferia do Distrito Federal.
Para o instalador de TV a cabo Hugo Santos, de 35 anos, falta informação sobre as condições de segurança. “Não tenho como saber se uma rua é perigosa ou não,” diz. “Minha impressão é de que a violência diminuiu, porque ouço menos reclamações sobre assaltos. Mas é apenas intuitivo.”
Propaganda oficial
O WhatsApp também é usado pela prefeitura para enviar releases e vídeos institucionais à população. Um exemplo são as transmissões da Hora Cívica instituída pelo prefeito, realizada às segundas-feiras em frente à prefeitura, com a presença dos secretários e banda de música, quando ele anuncia os atos programados para a semana.
Fernando Adriano, de 41 anos, é um dos “disseminadores de conteúdo” da prefeitura. Funcionário municipal, ele administra um espaço comunitário usado para festas e reuniões dos moradores dos conjuntos habitacionais Parque Jardim Nápolis, com 5 mil famílias, Parque Araguari, com 4 mil famílias, e do conjunto Casinhas, de 500 famílias de baixa renda. Ao lado do espaço público há uma creche inacabada.
O administrador repassa as mensagens da prefeitura a quatro outros grupos: dos moradores do Parque Nápolis, dos fiéis da Igreja São José, que fica no bairro, dos funcionários da Secretaria de Infraestrutura e dos moradores do conjunto habitacional de Casinhas, ao lado da igreja. Só ele repassa o material da prefeitura a cerca de 500 pessoas.
Além do material para o WhatsApp, a prefeitura produz oito publicações impressas por ano, que são distribuídas em vias públicas. Em dezembro de 2018, saiu uma edição especial de 12 páginas sobre “conquistas” na educação, segurança, infraestrutura, assistência social, saúde, trabalho, meio ambiente em transparência.
** Elvira Lobato é jornalista.