Para pensar, com o professor de jornalismo Nilson Lage

Por Nilson Lage*,


Coisas idiotas que a globalização fez com o jornalismo brasileiro: 1. Usar a palavra “suposto” a torto e a direito. Tudo que o jornal publica é suposto (ele não tem que provar, já que se baseia em depoimentos orais e indícios, quando não opina no vazio), de onde melhor seria um aviso: “Tudo que se publica nestas páginas é suposto” – e pronto. 


2. Informar o que o advogado de qualquer pessoa envolvida numa notícia disse, quando ele não disse nada que merecesse ser publicado. Primeiro, porque advogado, juiz, promotor etc. têm mais que falar no processo, não no jornal. Segundo, porque a rotina de ouvir as partes envolvidas em um caso não obriga a publicar a não-informação oferecida por essas partes. 


3. A mania (esta, tupiniquim) de atribuir ao “Ministério Público” o que qualquer procurador faz ou ameaça fazer. 


Os procuradores, muitos deles jovens idealistas convencidos de que são os únicos sujeitos honestos na humanidade, podem e costumam ter idéias e implicâncias próprias, de modo que se especializam em combater o Enem, as hidrelétricas, os estádios, o agronegócio, o movimento dos sem-terra etc. – e isso morre no desejo ou esbarra no senso comum de algum juiz. 


4. Da mesma forma, atribuir à “Justiça” o que qualquer juiz ou tribunal decide. Juízes e tribunais têm lá suas idiossincrasias, que manifestam em liminares e sentenças logo corrigidas adiante. 


Assim, os beach clubs, os IPTUs, a Usina de Belo Monte são interditados e revalidados sucessivamente, deixando perplexo o pobre cidadão que considera “a Justiça” um negócio confiável tanto quanto o jornal – no que, aliás,em ambos os casos, é muito ingênuo.


*Jornalista, nascido em 1936. Professor universitário (UFSC e UFRJ) aposentado compulsoriamente em 2006. Doutor em Linguística, com ênfase em semântica.

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