Saúde no Brasil pelo SUS: a estória da consulta do seu Sandro Abel Soares dos Santos





Por Jefferson Victor, 

– Senhor Sandro Abel Soares dos Santos!


Ecoou o grito da enfermeira pelo corredor do hospital.


– Sou eu! Caramba! depois de dois meses finalmente vou ser atendido.


– É o senhor? 


– Sim, moça sou eu! 


– Olha o seu médico não pode vir hoje, o senhor deverá marcar a consulta para outro dia. 


– Então marca ai, moça, por favor.


– Olha seu Sandro, não sou eu quem marca, o senhor deverá procurar o setor de marcação de consultas no outro pavilhão. 


– Tá bom, moça vou lá.


– É aqui que remarca consulta, senhora? 


– Você tá com a senha? 


– Senha? Que senha? 


– A senha para marcar a consulta, você tem que pegar ela, pra isto tem que chegar aqui bem cedinho, senão não consegue.


Aff Maria, eu marquei essa minha consulta faz dois meses, tô com umas dores no peito, folego curto, acho que meu problema é grave, mas fazer o que? 


Não tenho plano de saúde e muito menos dinheiro para pagar particular, o jeito é esperar.


Dias Depois


São quatro da manhã, estou chegando pra remarcar minha consulta pela terceira vez. Nossa! Tem umas duzentas pessoas já na fila, será que vou conseguir a tal senha?


É, agora são nove horas já tá chegando a minha vez, só tem uns dez na minha frente.


– Atenção vocês aí da fila, as senhas de hoje já esgotaram, quem quiser marcar consultas terá que voltar amanhã.


Nossa, eu já tava tão pertinho, acho que minha sorte não está me ajudando muito não.


Bem, hoje cheguei as três da manhã, só tem uns cem em minha frente, hoje eu chego lá e saio com a consulta marcada.


– Atenção, senhores! Diz a atendente.


– Tivemos um pequeno problema no sistema e hoje não temos como marcar consultas, os interessados deverão voltar outro dia.


– Amanhã, moça? 


– Não sei, senhor, vai depender do computador.


– Tá bom, eu volto depois.


Finalmente hoje consegui, peguei a senha e marquei minha consulta pra daqui um mês, mas tá bom, vou tomando uns chazinhos caseiros até esse dia chegar.


Trinta dias se passaram, e novamente ecoa o grito da atendente.


– Senhor Sandro Abel Soares dos Santos!


– Sou eu, moça! Sala um, o doutor está te esperando.


– Olá, seu Sandro, como está o senhor?


-Do jeito que Deus quer, doutor, meio perrengue, mas tô sobrevivendo.


– Nossa, seu Sandro, sua pressão tá vinte e quatro por doze, vou mandar aplicar uma injeção, o senhor vai fazer esses exames e depois me procure pra ver os resultados.


– Sim, senhor, doutor, aonde é que faço eles? 


– O senhor procura o setor de marcação de exames lá no segundo pavilhão.


– Tá bem, doutor, espero estar de volta brevemente.


– Moça o doutor me mandou marcar esses exames, meu caso é grave e ele tem pressa em ver o que tá sucedendo comigo.


– Senhor, o de sangue tá marcado pro final do mês, os outros só daqui a trinta dias, isso é, se o aparelho for consertado.


Bom, Já passaram os trinta dias, hoje vou fazer meus exames.


-Bom dia, moça, tá aqui a papelada, tô cada dia pior de saúde, espero que ainda dê tempo pra entregar pro doutor hoje mesmo.


– Não, seu Sandro, o resultado só sai daqui uns dez dias, o senhor vai ter que voltar aqui, pegar o resultado e marcar o retorno com seu médico.


Ufa! Dez dias se passaram,  estou com o resultado na mão, agora é só entregar para o médico e ver qual remédio vai me passar.


– Seu Sandro, marcamos seu retorno para daqui vinte dias, o senhor traz tudo isso ai pro doutor ver e passar seu remédio. Ah, o senhor deixa o seu telefone, se aparecer uma vaga antes  a gente liga pro senhor.


É!  vinte dias se passaram, hoje já vim carregado, minha saúde fragilizou muito, mas foi o dia que a moça marcou, espero que seja atendido.


– Olha, seu Sandro, o médico do senhor entrou de férias.


– Faz assim: tenho visto que o senhor tem batalhado  muito pra ser atendido, tenho seu telefone aqui, e a primeira vaga que surgir eu pessoalmente ligo pra o senhor.


– Tá bom, moça, muito agradecido, a senhora foi muito gentil comigo.


– Por nada, seu Sandro o senhor é muito educado, bem diferente de uns que são impacientes e brigam com a gente.


Dias depois.


Alô, aqui é do hospital, gostaria de falar com o seu Sandro, finalmente ele vai poder mostrar o resultado dos exames, demorou mas o médico que cuida dele retornou de férias.


– Oi, moça, aqui que fala é a esposa dele, estamos acabando de chegar do cemitério, o Sandro faleceu ontem, foi um infarto fulminante.


– Que pena, hoje ele ia ser atendido pelo doutor, aceite os meus sentimentos.
Obrigada, moça, a senhora é muito gentil.


Conclusão:  a  estória do Sandro Abel Soares dos Santos se funde com a história da maioria de nós, brasileiros, que depende todos os dias da boa vontade dessa máquina falida, que se chama saúde pública.

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