Brasil ainda precisa compreender o real valor de suas florestas
Fornecimento de água e alimentos, insumos para medicamentos, promoção do bem estar mental e físico, sequestro de carbono, regulação do clima, controle de erosões e proteção à biodiversidade.
A lista de benefícios gerados pelas florestas é extensa, unindo aspectos ecológicos, econômicos e sociais, mas especialistas ressaltam que ainda há um desconhecimento na sociedade a respeito do valor das áreas naturais.
O Brasil, que possui cerca de 12% das florestas do mundo, de acordo com o Relatório de Avaliação Global dos Recursos Florestais da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), publicado em 2020, mantém 497 milhões de hectares de matas nativas, sendo o país com a maior diversidade nesse campo, somando mais de 9 mil espécies.
“Precisamos avançar na consciência coletiva e na construção de políticas públicas que considerem a presença de florestas, a produção de alimentos e a manutenção da infraestrutura de forma complementar e harmoniosa. Todos ganham tendo florestas bem conservadas na paisagem local e regional.
A floresta, além dos benefícios que gera para a própria natureza, traz subsídios essenciais para as pessoas, aumentando a produtividade de culturas agrícolas, a proteção da água e do solo, melhoria do clima, entre outros fatores fundamentais para a manutenção da nossa vida”, salienta Ricardo Ribeiro Rodrigues, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) e professor do departamento de Ciências Biológicas da Escola Superior Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq/USP).
O Banco Mundial estima, conforme demonstrado no relatório Equilíbrio Delicado para a Amazônia Legal Brasileira: Um Memorando Econômico, que a Floresta Amazônica preservada gera US$ 317 bilhões (cerca de R$ 1,5 trilhão) por ano.
O valor considera o carbono armazenado, a contribuição ao regime de chuvas de todo o continente, os recursos da biodiversidade, o turismo sustentável, entre outras possibilidades. Segundo os cálculos da instituição financeira, a floresta em pé supera em até sete vezes os lucros potenciais obtidos com formas tradicionais de exploração, como agricultura extensiva, exploração madeireira e mineração, que provocam a degradação do bioma.
Rodrigues ressalta que o manejo sustentável – tanto a conservação de áreas florestais primárias quanto extensões restauradas –, ainda pode gerar muitas divisas ao país nas próximas décadas.
“Precisamos enxergar a floresta como uma oportunidade, com sequestro de carbono, proteção da biodiversidade, produção sustentável de produtos madeireiros e não madeireiros, como mel, frutas, bioativos e biofármacos, entre outras possibilidades”, explica o professor da Esalq/USP.
Apesar da queda de 33% nos alertas de desmatamento na Amazônia no primeiro semestre deste ano, de acordo com o Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter), os índices de perda florestal seguem preocupantes no Brasil.
No Cerrado, por exemplo, os alertas de desmatamento cresceram 21% no mesmo período. Rodrigues acredita que, embora a realidade seja desafiadora, o futuro pode ser promissor.
“Existe a real possibilidade de integrarmos conservação, restauração, produção de alimentos e serviços ambientais na mesma paisagem.
Percebo que o novo governo federal tem essa sensibilidade, mas é preciso colocar isso como prioridade e, principalmente, transformar as boas intenções em ações efetivas. Todos devem perceber que manter e restaurar florestas é um excelente negócio para o país”, reforça o pesquisador.
Saúde e bem-estar
O livro “Nature and Public Health: The role of nature in improving the health of a population” (Natureza e Saúde Pública: O papel da natureza na melhoria da saúde de uma população, publicado em 2018), traz um compilado de pesquisas realizadas em várias partes do mundo que concluíram que o contato com as florestas gera inúmeros benefícios para a população.
Segundo a Dra. Matilda Van Den Bosh, uma das organizadoras do livro, várias funções biofisiológicas do corpo humano dependem de um ecossistema saudável, por isso as florestas devem ser entendidas como parte fundamental da saúde e bem estar humano.
Esta conexão proporciona uma queda do nível de cortisol no organismo – o hormônio do estresse –, redução da pressão sanguínea e declínio da frequência cardíaca. Contribuições para melhorar quadros de ansiedade e depressão também já estão sendo pesquisados em diversos locais, levando, inclusive, médicos a receitarem “banhos de floresta” para seus pacientes.
Como cerca de 85% das pessoas vivem em áreas urbanas no Brasil, segundo a última Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios do IBGE, de 2015, especialistas também ressaltam a importância das florestas em grandes adensamentos.
“As árvores e florestas integradas às cidades, tais como a arborização urbana, praças e parques, já são reconhecidas como fundamentais para o bem-estar da população. Elas são responsáveis por amenizar os efeitos poluentes da urbanização, pela purificação do ar e da água, por permitir uma melhor absorção da chuva (evitando alagamentos), bem como pela manutenção do microclima local”, explica a gerente sênior de Conservação da Natureza da Fundação Grupo Boticário, Leide Takahashi, também membro da RECN.
A Fundação, que atua há 32 anos em diversas frentes em prol da conservação da natureza, é responsável por criar e manter duas Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN): a Reserva Natural Salto Morato, localizada em Guaraqueçaba (PR), na Grande Reserva Mata Atlântica; e a Reserva Natural Serra do Tombador, em Cavalcante (GO), no coração do Cerrado.
Ao todo, a instituição conserva aproximadamente 110 quilômetros quadrados de áreas naturais, que representam espaço equivalente a 70 Parques do Ibirapuera, e contribuem para a preservação integral de ecossistemas, proporcionando a diversas espécies a oportunidade de continuar vivendo em seu habitat natural.
Texto: ComVc Portal