Só descambando, e daí?: Hospital do RJ tem fila de corpos e BO por falta de médicos; 7 se demitiram

Funcionários do Hospital Municipal Lourenço Jorge, na Barra da Tijuca, denunciam um cenário de crise na principal unidade de emergência na zona oeste do Rio. 


Com a capacidade do necrotério lotada, o hospital tinha corpos enfileirados em cima de macas, conforme mostram fotografias feitas na tarde de ontem (28) em um corredor da unidade.

Dois profissionais do Lourenço Jorge morreram em decorrência da covid-19 e ao menos sete médicos pediram demissão alegando falta de condições de trabalho. 


Uma enfermeira do hospital registrou ontem ocorrência policial após a morte de uma paciente com a doença, que sofreu parada cardiorrespiratória na ala dedicada ao tratamento de coronavírus. 

Não havia médico no local, que conta com 11 pacientes —quatro deles estão na UTI e respiram com a ajuda de aparelhos.Segundo funcionários ouvidos, o necrotério da unidade, com capacidade para 25 corpos, está lotado. Ontem à tarde, o estacionamento da emergência ficou isolado, chamando a atenção de quem trabalha no local. 

O espaço foi destinado a um contêiner refrigerado, que será usado para armazenar corpos.

“Na segunda-feira [27], quando saí do plantão, vi que isolaram o estacionamento com uma fita. Achei que fosse alguma obra. Hoje [ontem], colocaram um contêiner colado na porta do necrotério. Tem muita gente morrendo. É assustador”, relata a técnica de enfermagem Elaine Sales.A informação foi confirmada pela Prefeitura do Rio, que negou contudo a lotação do necrotério e disse que a iniciativa era preventiva.

“A informação sobre ‘corpos amontoados’ não procede. Além de possuir um necrotério, o hospital alugou, preventivamente, um contêiner que poderá ampliar a capacidade de armazenamento, se necessário”, respondeu, em nota enviada pela assessoria de imprensa da Secretaria Municipal de Saúde.
Enfermeira registra BO por falta de médico após morte

Transferida desde segunda-feira (27) para trabalhar no “covidário”, nome da ala destinada a pacientes com sintomas de covid-19, a enfermeira Priscila Gomes Villela decidiu denunciar a falta de médicos no local após a morte de uma paciente, registrada à 0h46 de ontem.

Se estou com paciente no covidário, tem que ter médico lá dentro. Muitos pediram demissão no início da pandemia e outros foram afastados com sintomas de covid. Mas não houve reposição. Não vou ter as minhas mãos sujas de sangue por incapacidade do hospital

Priscila Gomes Villela, enfermeira

Ela disse ter pedido ajuda aos residentes da ala de cirurgia geral após a paciente sofrer uma parada cardiorrespiratória. O caso também foi encaminhado ao MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) e ao Conselho Federal de Enfermagem.

Priscila Villela também tem medo de se contaminar na ala destinada a pessoas com a covid-19.

No covidário, há um nível elevado de carga viral. Perdemos inúmeros pacientes lá dentro. E já tivemos outros plantões lá sem médico responsável. Esse descaso tem que acabar
Parentes em espera por atestado de óbito

O UOL teve acesso a conversas pelo WhatsApp entre profissionais de saúde da unidade em um grupo chamado “Setor de Urgência HMLJ”, sigla do Hospital Municipal Lourenço Jorge.

Nelas, os colegas discutiam justamente a falta de médicos e informavam duas mortes na ala destinada a pacientes com covid-19. Os diálogos ocorreram ontem à tarde.

“Estamos em tempos difíceis e espero a ajuda de todos. Hoje ficamos sem clínicos e não temos chefes de equipe em quase nenhum plantão. Preciso que os atestados de óbito sejam feitos por qualquer médico da casa e de qualquer especialidade. (…) Toda família tem direito ao atestado para poder enterrar o seu familiar. Hoje tivemos 3 óbitos, 2 no covidário e 1 na enfermaria.”

Em seguida, a profissional de saúde relatou a espera de parentes para a liberação dos corpos. “Parece que as famílias já estão esperando e a Administrativa do setor de admissão e alta não está conseguindo falar com os médicos”. E finalizou a mensagem informando que ela e outra profissional estão afastadas por terem testado positivo para covid-19.

Uma enfermeira contestou: “Um setor com suporte para paciente com covid sem médico? A prefeitura não está repondo [profissionais licenciados por terem contraído a doença]? Absurdo demais isso!”.


O que diz a Prefeitura do Rio

Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde disse que serão feitas adequações nas escalas. Mas não informou se irá contratar novos médicos.

“O Hospital Municipal Lourenço Jorge tem profissionais de saúde afastados por licença médica, no entanto, está sendo feita readequação de escalas para garantir assistência aos pacientes”, informou.

A secretaria foi questionada sobre a denúncia de falta de médicos na ala dedicada ao tratamento de covid-19 no momento da morte de uma paciente. A pasta informou que irá investigar.

Segundo a pasta, foram abertos 424 leitos exclusivos pela rede municipal para o tratamento de pacientes com a covid-19 desde o início da pandemia —138 são UTIs (Unidades de Terapia Intensiva). 


Ontem, havia 431 pessoas internadas com sintomas da doença, de acordo com a Prefeitura do Rio, e outros 275 pacientes à espera de transferência para UTIs. “A taxa de ocupação de leitos de UTI para covid-19 na rede SUS é de 97%”.

Com informações da Folha 

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