Atacante brasileiro relata sua fuga da Ucrânia; jogador estava a 1h30 de distância da primeira cidade atacada
Em conversa com o Sambafoot, o atacante brasileiro falou da trajetória no futebol europeu e sobre tudo o que passou ao fugir da Ucrânia após a invasão russa
Lucas Rangel tem apenas 27 anos, mas já jogou em vários países do futebol europeu. O atacante, que nasceu em Alvorada, no Rio Grande do Sul, nunca hesitou em deixar o Brasil para evoluir em clubes no exterior.
Em entrevista para o Sambafoot, o campeão na Albânia e também na Finlândia conta que viveu momentos de alegria e de tensão no Velho Continente. O mais marcante foi quando jogava pelo Vorskla Poltava, da Ucrânia – time que passou a fazer parte em setembro de 2021. E ele estava lá quando a invasão russa ao país aconteceu, em fevereiro desse ano, e que resultou em uma verdadeira saga para deixar o país. “Foi um momento de pânico, principalmente para nós, estrangeiros. A primeira cidade a ser atacada ficava a uma hora e meia da nossa”.
Início da carreira e mudança para a Europa
Lucas Rangel foi revelado pelo Londrina, do Paraná, em 2015. Ele rodou por outros clubes brasileiros, como o Grêmio Barueri, até ter a primeira oferta, um ano depois, para se transferir para o futebol europeu. O Kukesi, da Albânia, era o clube interessado. Ele não sabia nada sobre o país e não falava nenhum outro idioma além do português, mas encarou o desafio e hoje dá uma dica para a nova geração. “Meu recado para os jovens atletas que têm o sonho de vir jogar na Europa é começar a aprender o inglês, porque vai ser bastante exigido por aqui”.
O paranaense também passou por clubes da Áustria, Finlândia, Turquia, Ucrânia e Azerbaijão, onde está hoje, defendendo o Sabah FC. Muitos jogadores, às vezes, evitam se mudar para países considerados “alternativos” no meio do futebol, mas Lucas diz que não se arrepende por nenhum segundo de suas escolhas. “Tem que dar a cara a tapa e vir para a Europa sem medo, porque depois não tem arrependimento nenhum”.
Em todos esses países, passou por experiências únicas e inesquecíveis. Na Finlândia, por exemplo, sentiu na pele, literalmente, o maior frio da vida – quase 30 graus Celsius negativos! Na Turquia, teve um desentendimento com o técnico do time por não falar o mesmo idioma. E na Ucrânia, uma experiência complicadíssima que, como ele mesmo disse, não deseja “nem para o pior inimigo”.
Drama e saga para fugir da Ucrânia
Apesar de ter gostado do futebol e do povo ucraniano, o atacante, enquanto defendia o Vorskla Poltava, decidiu fugir do país depois que o conflito com a Rússia começou, em fevereiro desse ano. “Quando começamos a escutar os rumores de que poderia haver uma guerra, ninguém acreditava, nem mesmo os ucranianos. Infelizmente, não foi isso o que aconteceu. Quando nós, jogadores, ficamos sabendo da situação real, foi um momento de pânico, principalmente para os estrangeiros”.
De Poltava, onde vivia, Lucas deixou tudo para trás e partiu rumo a Lviv, cidade que faz fronteira com a Polônia, com o intuito de fugir da guerra que já havia iniciado. O caos instalado no país fez com que uma viagem, que duraria normalmente 12 horas, se transformasse em um percurso de mais de 30 horas. Durante o trajeto, o atacante mandava sua localização, fotos e vídeos para sua esposa no Brasil, e chegou a avisar que, se ficasse um tempo sem dar notícias, era porque o pior havia acontecido.
Ao chegar no seu destino, ele não conseguiu atravessar a fronteira do país vizinho na primeira tentativa. Só após insistir por três ou quatro vezes é que ele conseguiu passar para o outro lado do portão. Mas não foi simples, e houve momentos em que ele achou que não fosse conseguir.
O percurso até Lviv foi de carro, junto com um casal de pastores e com uma senhora ucraniana, sogra de um influencer brasileiro que havia pedido a ajuda de Lucas para tirá-la do país. Com fome, frio e muito cansaço, o grupo levou, no total, cerca de três dias entre a saída de Poltava até finalmente conseguir entrar na Polônia. De lá, o jogador seguiu para Portugal, para depois embarcar rumo ao Brasil e reencontrar sua família.
“Um momento que marcou foi quando a gente estava fugindo de carro, no meio da floresta, e passou um jato rasante que parecia próximo, mas não dava para enxergar pois estava escuro. Logo depois, vimos um clarão no céu – era o jato, da Rússia, sendo abatido por um caça da Ucrânia”.
Expectativas para o futuro
Após o início do conflito, a FIFA comunicou que jogadores estrangeiros que estavam atuando na Ucrânia e na Rússia estariam liberados para jogar em outros países. Lucas aproveitou a medida e acertou, por empréstimo do Vorskla, com o Sabah, do Azerbaijão. Ele diz que não sabe o que fará no futuro, mas que uma coisa é certa: não quer voltar para a Ucrânia de jeito nenhum.
“Eu converso muito com meus colegas de profissão que jogavam na Ucrânia e, para ser sincero, ninguém quer voltar para lá.”
O contrato com o Sabah é apenas até junho, e o atacante disse que já apareceram outros clubes interessados em seu futebol e que vai analisar tudo. Ele contou, também, que a Federação Ucraniana de Futebol pensa em colocar seus clubes filiados para jogarem em outro país. Mesmo sem saber o que vai fazer, ele garante que não se vê fora da Europa tão cedo e, por agora, não pensa em retornar ao Brasil.
“Quando a gente é gaúcho, a vontade é enorme de jogar na dupla grenal. Mas, se depender do meu agente, que eu confio muito, eu não volto para o Brasil tão cedo.”