CNJ, em ação nacional, emite primeiros documentos para pessoas presas no Espírito Santo
A ação nacional de identificação civil e emissão de documentos a pessoas egressas do sistema prisional coordenada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) resultou na emissão dos primeiros documentos no Espírito Santo nesta semana.
A iniciativa é articulada desde 2019 por meio de parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e apoio do Ministério da Justiça e Segurança Pública no programa Fazendo Justiça.
Há, ainda, engajamento de dezenas de instituições nacionais e locais comprometidas com um novo olhar para pessoas egressas do sistema prisional – no primeiro semestre do ano passado foram emitidos quase 225 mil alvarás de soltura no país, de acordo com dados do Departamento Penitenciário Nacional.
Entre as diferentes frentes da ação, está a emissão documentos na porta de saída do sistema prisional por meio de automação no Sistema Eletrônico de Execução Unificado (SEEU).
O novo fluxo, que resultou na emissão de 20 certidões de nascimento na quinta-feira (25/3) no Espírito Santo, já foi pactuado com 20 estados e estará em funcionamento em todo o país até o final do ano.
O conselheiro do CNJ Mário Guerreiro, supervisor do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), explica que o papel do Conselho é apoiar os Tribunais de Justiça a estruturarem as iniciativas.
“É importante ressaltar que apenas com o compromisso de tantos atores nos estados é possível o sucesso de ações como esta que tanto nos enche de orgulho e de esperança. O papel do CNJ é construir subsídios técnicos personalizados para cada estado que executará as ações.”
Segundo o juiz auxiliar do CNJ com atuação no DMF Fernando Pessôa da Silveira Mello, a documentação garante uma reinserção com mais direitos.
“Este projeto busca fazer com que pessoas privadas de liberdade que venham a readquirir liberdade tenham condições para isto com todos os direitos da vida civil”, afirma. “Além de conferir cidadania à população egressa, o CNJ busca conferir dignidade também. Este é um projeto de Estado, não restrito ao Poder Judiciário. Temos vários parceiros para alcançar este objetivo.”
Protagonismo local
Entre os principais parceiros do CNJ para a concretização da ação de identificação civil voltada às pessoas privadas de liberdade com foco em sustentabilidade, estão o Poder Judiciário e o Poder Executivo de cada estado.
No Espírito Santo, houve apoio do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMF) do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) e da Secretaria estadual de Justiça (Sejus-ES).
Para o supervisor do GMF local, desembargador Fernando Zardini, a documentação civil é o primeiro degrau no processo de ressocialização. “Ela devolve ao egresso sentimento de pertencimento, de identidade, permitindo-lhe acessar as oportunidades de trabalho e os serviços públicos, tais como saúde e educação.”
Gisele Souza de Oliveira, juíza e coordenadora do GMS no estado, destacou a parceria com o CNJ como propulsora dos avanços observados no sistema prisional capixaba.
“A equipe local do Fazendo Justiça tem mantido importante interlocução com todas as instituições que atuam na execução penal, propondo soluções factíveis e consensuadas entre esses diversos atores, contribuindo para um crescimento institucional excepcional.”
Segundo a gerente de Educação e Trabalho da Sejus-ES, Regiane Kieper do Nascimento, o objetivo é executar politicas de reinserção social da pessoa privada de liberdade por meio de ações que garantam e resgatem a cidadania. “A iniciativa do fluxo automatizado de emissão de documentação civil vem contribuir para o processo de reinserção social digno após o cumprimento da pena.”
Para a presidente da seção Espírito Santo da Associação de Registradores de Pessoas Naturais (Arpen), Nelisa Galante, a ação vai além da cidadania, garantindo a dignidade da pessoa humana.
“Ganha o estado do Espirito Santo, que poderá aplicar com mais eficiência e exatidão as políticas públicas. E, por consequência, ganha a sociedade”, afirma. “Ter um documento de identificação transforma todo um cenário social, transforma ausência de possibilidade em possibilidades concretas e, acredito, tem o poder de transformar, inclusive, o sentimento dessas pessoas.”
Nas ações de emissão de documentação civil, também participam o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a Receita Federal e outros órgãos da administração federal, como os ministérios da Economia, da Defesa e da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Entre os parceiros locais estão os tribunais de justiça e federais, institutos de identificação e administrações penitenciárias.
Ação coordenada
A emissão dos documentos é agora integrada ao SEEU, que passou por atualizações para elaboração de listas de pessoas egressas e pré-egressas – ou seja, aquelas que estão a menos de seis meses de mudança de regime ou da liberdade.
De posse desta lista, de acordo com o fluxo estabelecido com os estados, as secretarias de Administração Penitenciária podem solicitar a emissão de documentos em série no portal da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen Brasil), entidade que desde 2019 tem parceria firmada com CNJ para esse propósito.
A coordenadora técnica do núcleo de identificação civil e documentação do Fazendo Justiça, Ana Teresa Iamarino, destaca o trabalho conjunto com as equipes estaduais para o sucesso da empreitada, lembrando que o Mato Grosso do Sul, por exemplo, participou de testes para a funcionalidade, ajudando inclusive a corrigir erros e aprimorar o fluxo estabelecido.
“As equipes técnicas dos órgãos estaduais assumiram esta parceria com o CNJ e permitiram que o Espírito Santo desse início à emissão que, em breve, estará em todo o país.”
Outro fluxo importante é com os Escritórios Sociais, equipamentos de atenção a pessoas egressas estimulados desde 2016 pelo CNJ e também fortalecidos por meio do programa Fazendo Justiça.
“A emissão de documentos se insere em conjunto mais amplo de estratégias da metodologia de mobilização de pessoas pré-egressas, articulada pelos Escritórios Sociais. Neste período de 180 dias antes de sair da unidade prisional, a proposta é que as unidades prisionais realizem um conjunto de atividades, individuais e em grupo, para orientação e construção de um plano de saída, organizando projetos de vida pós-encarceramento para retomada de laços familiares e sociais”, explica o coordenador do eixo de Cidadania do Fazendo Justiça, Felipe Athayde Lins de Melo.
Outras frentes
A elaboração de listas de egressos e pré-egressos está inserida em um conjunto maior de ações do CNJ para garantir documentação civil a pessoas privadas de liberdade.
Outra linha de atuação é a aquisição de 5,4 mil kits de coleta e identificação biométrica que serão distribuídos a todo o país com objetivo de garantir a cobertura da porta de entrada do sistema prisional – as pessoas que passarem por audiência de custódia já terão a situação documental conferida, com encaminhamentos para emissão daqueles documentos que forem necessários.
Além da coleta por meio dos kits biométricos, o CNJ também está promovendo a integração dos bancos de dados já existentes em 13 estados ao Banco Nacional de Dados de Identificação Civil, mantido pelo TSE.
Entre os impactos projetados, estão pelo menos 290 mil novas identificações cadastradas por ano, com redução nas falhas de identificação e gestão interestadual otimizada a partir de base de dados nacional. Dados do Depen mostram que cerca de 80% das pessoas privadas de liberdade em 10 estados não possuíam qualquer documento em seus arquivos nas unidades prisionais.
Em 2019, o CNJ editou a Resolução nº 306, que estabelece diretrizes e parâmetros para a emissão de documentação civil e para a identificação civil biométrica das pessoas privadas de liberdade. O objetivo é estruturar uma ação de longo prazo a partir da troca de experiências entre os estados, o que inclui fluxos e integração de sistemas.
Fonte: CNJ