O perigoso cala-boca do judiciário


Por Valmir “Crispim” Santos, *

Ontem ao ler os principais jornais
brasileiros tive a sensação de risco iminente a nossa frágil democracia. 

O que
me deixou preocupado foram três decisões judiciais tomadas durante a semana, e
que coloca em risco o futuro do nosso propalado “Estado Democrático de
Direito”.

 A
primeira decisão vem Brasília, onde o Jornalista Paulo Henrique Amorim foi
condenado a pagar R$ 100.000,00, ao Ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar
Mendes,em função de críticas as suas decisões no caso Daniel Dantas em 2008. 

No
caso em questão o referido ministro deferiu alguns pedidos de habeas corpus em
benefício do banqueiro, mesmo com um caminhão de provas colhidas pela Polícia
Federal e a necessidade imediata de constituir novas provas.

O segundo e o terceiro caso vêm aqui mesmo
da terra do pequi, e é mais uma das pérolas do judiciário goiano. 

Aqui, o Jornalista
e por muito tempo assessor de comunicação das campanhas de Marconi Perillo foi
condenado a pagar ao governador (agora seu desafeto) uma quantia de R$
200.000,00 como reparação as críticas feitas pelo jornalista às relações do
governador com o grupo do condenado Carlinhos Cachoeira. 

Segundo Bordoni, parte
do pagamento do seu trabalho na campanha de Perillo em 2010 procede de uma
empresa fantasma, pertencente ao grupo de Cachoeira, o que o governador tenta
desqualificar.

O lado negro dessa história é que tudo que
o Jornalista Bordoni disse na CPMI que investigou o caso ele comprovou frente a
imprensa e ao judiciário. 

Incluindo ai ligações telefônicas de assessores do
governador em períodos bem próximos aos depósitos feitos na conta de sua filha. 

Mesmo assim o judiciário entendeu que o jornalista estava simplesmente
caluniando o governador, e que os recursos depositados na conta de sua filha
eram frutos de chantagens feitas por este ao empresário condenado Carlinhos
Cachoeira. 

Só que contra essa acusação feita a Bordoni também não há provas, o
que por tese deveria derrubar os argumentos da acusação e aumentar a
credibilidade das palavras do jornalista. 

Blogueiro censurado 

Mas o juiz do caso decidiu por calar
a boca do blogueiro, assim como já ocorreu com vários jornalistas nos últimos
tempos em Goiás.

Não menos intrigante foi o mandado de
soltura dos acusados de assassinar o Jornalista e cronista esportivo Valério
Luiz em 2012. 

Todos foram colocados na rua simplesmente porque o judiciário
entendeu que não persistem mais as razões que os levaram à prisão. 

Bem, à
sombra do direito pode não persistir, mas para sociedade, a família e
principalmente às testemunhas essa foi uma decisão não muito adequada. Ocorre
que a banca de advogados que os defendem é a mais cara de Goiás (são daqueles
que não pegam uma causa por menos de alguns milhões de reais), algo que poucos
podem pagar. 

E de agora em diante todos os esforços serão empregados no intuito
de desqualificar o inquérito e as provas produzidas pela Policia Civil de
Goiás. Corre até o risco do Jornalista Valério Luiz morto em 2012, se tornar um
dos bandidos mais temidos do Estado.

A minha preocupação nos casos colocados é
fundamentalmente o rumo que está tomando a relação imprensa x judiciário no
Brasil. A julgar por essas decisões e outras recentes aqui não relatadas, o
poder judiciário vem impondo um cala boca perigoso e desnecessário à imprensa
brasileira. 

Algumas forças estão querendo acabar com o papel social
desempenhado pelo jornalista, o de fazer valer o direito a informação. 

Esse
papel tem sofrido constantes e duros golpes nos últimos tempos, ao ponto de
impor novos limites a essa carreira.

O cala–boca imposto pelo judiciário fere
profundamente uma categoria de trabalhadores que ao longo de nossa história
transformou – se num dos elementos mais fortes da democracia, exercendo um
papel fiscalizador e dando voz aos menos favorecidos frente aos mandos e
desmandos dos agentes públicos. 

Mas, se levarmos em consideração a postura do
judiciário em decisões recentes concluiremos facilmente que fazer jornalismo
sério nesse país (especialmente em Goiás), tornou – se um risco à integridade
física e financeira desses profissionais. Ao contrário dos parlamentares eles
não são protegidos pelo Art. 53 da Constituição Federal.

No caso de Goiás, desde o episódio
envolvendo o apresentador Jorge Kajuru que foi vítima de inúmeros processos
patrocinados por homens públicos, tornou – se prática em nosso meio calar a
boca de jornalistas via judiciário. 

Prática de todos os partidos 

Essa prática está presente em todos os partidos
políticos, principalmente àqueles que representam o lado tradicional e arcaico
de fazer política em nosso estado.Como eleitor, cidadão a agente público que
sou, penso que às ações de qualquer homem público deve ser dada a devida
clareza e publicidade. Isso para que sobre elas não pairem quaisquer dúvidas. E
cabe ao profissional do jornalismo essa prerrogativa.

Ademais, vivemos num Estado Democrático de
Direito, no qual a Liberdade de Imprensa e Expressão não pode ser objeto de
Censura Judicial, ainda que as críticas sejam contundentes. A condição de
agente público pressupõe estar aberto às críticas, mesmo que sejam até
desleais, mas que faz parte do crescimento e aprimoramento do processo
democrático.

Aos cidadãos que queiram enveredar pela
vida pública fica a dica: se não quer ter sua conduta questionada não se
candidate a nenhum cargo público, pois dentre os princípios fundamentais da
democracia estão a clareza nos atos públicos e a obediência a vontade coletiva. 

E como coletivo queremos cada vez mais clareza no exercício de qualquer função
pública.

O que é inadmissível é o Poder Judiciário
se coadunar com a postura de alguns agentes públicos que se julgam acima de
qualquer suspeita, não aceitando críticas aos seus atos. 

Atos que deveriam ser
públicos diga se de passagem.
Lamentavelmente os homens de toga
esqueceram que a Liberdade de Imprensa e Expressão é o
principal pilar da democracia.

Esse definitivamente não é o papel que esperamos
do judiciário brasileiro.

PS: só espero não ser processado por essa
opinião.

*Geógrafo,
Professor e Mestrando em Geografia e Ordenamento do Território.

Universidade
Federal de Goiás

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