Alto Paraíso (GO): Educação escolar indígena e quilombola é tema de roda de prosa
Por Ana Ferrareze,
Na manhã deste domingo, a Tenda Literária Indígena recebeu uma roda de prosa sobre a educação escolar indígena e quilombola.
Foram convidados professores que são estudantes do MESPT (Mestrado Profissional em Sustentabilidade junto a Povos e Territórios Tradicionais) da UnB: Raimundo Magno Cardoso, Elaine Lopes Souza, Cosme Reté Xavante, Oscar Xavante, Creuza Khraô e Lucas Manchineri.
A discussão girou em torno das dificuldades encontradas por esses povos em educar as crianças, por conta da falta de incentivo do governo na criação de escolas dentro das aldeias e dos quilombos.
Eles precisam ir até as cidades para estudar, perdendo automaticamente o direito de viver sua cultura plenamente.
“Ouvimos muito sobre como as crianças que saem das aldeias e quilombos têm dificuldades de aprender química, matemática, biologia”, conta Raimundo. “Mas elas praticam essas matérias no dia a dia: usam a química para fazer a farinha de mandioca, matemática para calcular o terreno onde a roça será plantada, biologia para interpretar o tempo na hora de plantar e colher”.
Segundo o professor, as escolas tradicionais implantam um modelo educacional europeu que exclui as culturas tradicionais brasileiras.
Ele também aborda os programas de inclusão, incentivando as discussões sobre igualdade de oportunidades, que precisam ser frequentemente questionadas. “Fiz uma faculdade particular, com a ajuda do Prouni, e era o único aluno pobre e negro da minha turma”.
Elaine afirma que os negros passam por uma tentativa de embranquecimento. São julgados pela cor, pelo cabelo, pela religião. Um preconceito que não afeta apenas negros e indígenas, mas toda a sociedade, que terá seus povos exterminados dessa forma.
“Quando venho em um ambiente como esse é como se ouvisse as vozes de nossos ancestrais. O clamor de um povo que é morto todos os dias”, afirma.
Para ela, é uma grande falácia dizer que vivemos em uma democracia, que respeitamos os direitos dos povos tradicionais. As comunidades resistem com muita luta diante das invasões sofridas pelo governo, por fazendeiros e empreiteiras.
A lei está só no papel. “Quando os indígenas cantam no idioma próprio de cada aldeia sinto que isso foi tirado de mim”, desabafa. “Não conheço as línguas africanas, como iorubá e nagô”.
Por isso, Elaine defende a importância de os professores das crianças indígenas e quilombolas serem da comunidade, para que preservem e valorizem a identidade do povo.
Educação alinhada
“Nossa formação é muito familiar, com ensinamentos passados pelo pai e pela mãe”, explica Cosme Xavante. Professor em sua comunidade, consegue alinhar o calendário de aulas com as datas indígenas. A situação é complicada. Hoje, sua aldeia tem 320 alunos e pouquíssimas salas, sem acesso à internet.
Oscar Xavante continuou o discurso dizendo que a educação deveria ser elaborada pensando em costumes e tradições. Mas isso não acontece.
“O governo nos envia livros didáticos que não se enquadram na nossa cultura”, conta. É importante conhecer todas as ciências abordadas, mas é preciso adaptar o conteúdo à realidade das comunidades, para que eles possam ser usados de maneira prática e eficaz.
A professora Creuza Krahô diz que anos atrás os meninos de sua aldeia acordavam cedo todos os dias para correr com as toras, um ritual dos Krahô. Agora, estudando na cidade, eles têm horário para entrar na escola, o que acaba prejudicando algumas tradições.
“O sistema coloca a cultura em uma caixa, com crianças que não aprendem mais a sentir”, afirma. A educação pasteurizada não respeita lendas e mitos culturais, como exemplifica Lucas Manchineri, quando conta que para seu povo a lua é um homem envergonhado que fugiu.
“Eu acredito que podemos estudar a vida inteira e vamos morrer sem descobrir tudo”, fala Creuza. Então, por que limitar?
Fonte, Texto e fotos: Encontro de Culturas de Povos Tradicionais da Chapada