Feira de Experiências Sustentáveis reuniu grandes artesãos durante o Encontro de Culturas Tradicionais

A Feira de Experiências Sustentáveis do Cerrado de 2015, patrocinada pelo Sebrae, reuniu 16 artesãos na Praça do Encontro de 24 de julho a 1º de agosto. O movimento foi frequente do começo ao fim, todos os dias.
E o bate papo com os artistas rendeu muitos conhecimentos sobre produtos do cerrado, sustentabilidade e cultura popular. Vamos rever as histórias de algumas personalidades que encantaram e encontraram.
Música móvel
Danilo é o criador do ArteMóvel Musicall, carrinho que leva instrumentos desenvolvidos pelo artista e deixa todo mundo curioso. Morador de São Jorge há oito anos, começou a estudar maneiras de como fazer um som mesmo sem dinheiro. Deu certo. Hoje, desenvolve peças únicas como kalimbas, harpas de boca, minipercuterias, didjeridoos e clarinetes de bambu.
“O objetivo é decodificar a música aos passantes, que ficam arrebatados por engenhocas repletas de possibilidades de sons. Acabamos com a complexidade, tornando os instrumentos mais acessíveis”, conta.
Do Cerrado
Dona Ana Maria está com os produtos do doCerrado, de Taboquinha, em Padre Bernardo, Goiás, que vende licores de frutas nativas, farofas de castanhas do cerrado e materiais com papel reciclado. “Produzimos os licores há três anos. O de pequi é bom para antes da refeição, para abrir o apetite, ou depois, para a digestão”, explica Ana. É a terceira vez que ela vem à Feira. As farofas fizeram tanto sucesso, feitas com baru e caju, por exemplo, que precisou voltar à cidade para buscar mais. “Fazemos com a pimenta de macaco, que traz muitos benefícios à saúde, como ser anti-inflamatória”.
Cachaça com farofa
O casal Zé Nilo e Arlene já é anfitrião na Feira de Experiências Sustentáveis. Casados há 22 anos, vêm há 10 para vender suas cachaças artesanais, a maioria produzida com frutos do cerrado, como cagaita, buriti, mangaita e jenipapo. Antes do último dia do evento terminar, 150 litros já tinham saído. Outra delícia é sua farofa de soja. “Quando viemos nas primeiras vezes, notamos que havia muitos vegetarianos em São Jorge e resolvemos substituir nossa tradicional paçoca de carne pela farofinha”, conta Zé Nilo. Em Colinas, onde moram, são donos da loja Jiquitaia, a primeira MEI (Microempreendedor Individual) da cidade. Ali também vendem condimentos, como alho desidratado e chia, e a famosa cocada de baru, a primeira a acabar na Feira, tamanho sucesso que faz.
Arte sustentável
Maria do Cerrado é uma grande personalidade. Em 1998 começou a fazer artesanato, influenciada pelo filho, que já era artista plástico na época. Hoje, encanta com bijuterias de frutos secos do cerrado, como pau-terra, guatambu, peroba rosa e caroba, e luminárias de cabaça e bambu. Tem um ciúme danado de suas obras de arte. Enquanto conversávamos, um cliente chegou para comprar um abajur que ela nem havia terminado de construir.
Feito com um galho todo torcido, achado por Maria no rio, se tornou uma peça única. “Ah, não vou vender, não. Já me arrependi de ter falado o preço pra você”, respondeu Maria. Diante da insistência, acabou cedendo, mas não antes de tirar uma foto da obra. Em Goiânia, onde mora, também atua na Feira do Cerrado, desde 2004, e no Goiânia Mostra Artesanato, que atende mais de 60 artesãos, a fim de propagar novas maneiras de tornar o artesanato uma fonte de renda. “Uso meu trabalho para mostrar às pessoas que é possível aproveitar a natureza de forma sustentável”, conta a artista.
Cocar Fulni-ô
Keno Fulni-ô foi presença marcante durante a Aldeia Multiétnica e o Encontro de Culturas Tradicionais. Bom de papo, era inevitável sentar ao lado dele para uma boa prosa. Sua arte vai dos colares e pulseiras a instrumentos musicais, mas o que surpreende mesmo são os cocares. Imponentes, passaram para as cabeças de muitos dos visitantes. “Na nossa aldeia temos coruja, mutum, carcará, gavião. O com penas de arara nós trocamos com os Kayapós, porque na nossa não tem”, conta.
Pintura Yawalapiti
Anuiá Yawalapiti contou que só durante a Feira fez mais de 500 pinturas corporais. A sua banca nunca ficava vazia e já no primeiro dia de Encontro o que mais se via eram corpos circulando por São Jorge desenhados com símbolos indígenas, como o tapaká, a borboleta, a guelra de peixe e o rastro de cobra. Com as mãos pretas de jenipapo, Anuiá conta que não é sempre que sua cultura é valorizada como no Encontro e na Feira. “Se entro desse jeito em uma loja, as pessoas não deixam, os vendedores impedem que mexamos nas roupas, com medo de sujar”, disse. Além das pinturas, os Yawalapiti venderam seus tradicionais bancos de madeira em forma de animais, preciosíssimos, braceletes, tererés, cerâmicas e flautas.
A coletividade da Central Veredas de Artesanato
A Simone Amorim de Souza é uma das colaboradoras do coletivo. Ela veio de Minas, mais precisamente de Natalândia. As cidades de Arinos, Bonfinópolis, Buritis, Riachinho, Sagarana/Arinos, Serra das Araras/Chapada Gaúcha, Uruana de Minas e Urucuia completam o time de municípios participantes do coletivo. Ela contou que um município depende do outro.
“Um faz o tingimento, outro o tingimento do buriti, outro bordado. Todos vivem de artesanato. E minha principal preocupação hoje é resgatar a juventude que queria fazer esse trabalho. Está complicado, ainda mais hoje com essa internet”, desbafou. Enquanto isso, são as idosas que transformam o algodão em fio para fazer os tapetes e outros produtos que a Simone vendeu na feira.
Uma Gavião
Seu nome de branco é Maria Diva, mas seu nome indígena é Airy Gavião. Sua aldeia é no Pará, ela participou da feira pela Central do Cerrado, um coletivo com artesanato de quilombolas e ribeirinhos também. Aprendeu desde pequena a fazer artesanato na vivência com os adultos da aldeira. Hoje ela fica mais tempo na cidade por causa das feiras que participa. Também faz palestras em universidades e escolas divulgando sua cultura.
– E o preconceito? Como você lida com ele?
– Ainda há muito preconceito, ninguém gosta daquilo que não conhece. Hoje já temos voz, antes tínhamos que andar de cabeça baixa, hoje não deixamos mais isso acontecer. Nas universidades começamos a conversar, nos pedem pra voltar e nos olham de outro jeito. Eles tem muita curiosidade. Tem coisas que eles descobrem que a gente já conhece faz tempo.
Tipo as ervas medicinais. A economia solidária que está super na moda também já existe na aldeia faz tempo. Se tenho uma farinha, um peixe ou algo que você não tem, isso também é seu. Não tem porque você ficar sem.